terça-feira, 3 de maio de 2011



                                         l Zum Zum Zum 2011

Aconteceu nos dias 15,16e 17 de abril, na cidade de São Paulo, o l Zum Zum Zum. Organizado por Marcelo, Japa, Bruno, M. Parafuso e Tizil. O evento teve como convidados Mestres Ananias e Moraes, e contou com a presença de dezenas de capoeiristas de São Paulo e de outros estados.


M. Parafuso, Marcelo, Bruno, M. Ananias, Tizil, M. Moraes , Rafael e Japa.


Com o intuíto de promover um encontro focado nas tradições e fundamentos da Capoeira (rítmo, musicalidade e jogo) amigos capoeiristas de alguns grupos uniram forças para realizar um evento que retratasse o cenário da capoeira paulistana. Quem compareceu ao evento pode participar, além das rodas e dos treinos, das palestras proferidas pelo mestre Moraes. Nelas o mestre abordou questões à ancestralidade tema central do evento e também à musicalidade, sua importância e aspectos fundamentais dentro do jogo da Capoeira. Além de enfatizar e colocar em questão o papel político da Capoeira e do capoeirista na contemporaneidade.

Mestres Convidados e Homenageados



MESTRE ANANIAS e MESTRE MORAES


Mestre Ananias; Nascido na cidade de São Felix, Bahia em 1924. Período de descriminação e repressão policial ao negro e todo seu legado cultural, religioso e suas relações comerciais e humanas. Imerso no cenário de formação cultural de nosso país, mestre Ananias assume a Capoeira o Candomblé e o Samba de Roda como guia, verdade e vida. Em São Felix conta o seu convívio com mestre Juvencio que tocava berimbau ainda com cipó. Entre alguns mestres estavam os senhores Pastinha, Noronha, Nagé, Caiçara, Onça Preta, Cobrinha Verde, Canjiquinha de quem mais tarde recebeu o diploma de mestre entre outros. Porém no antigo Corta Braço, bairro de Liberdade, que seu Ananias ficou encantado e foi se achegando até fazer parte de um grupo rítmico de alta patente. A roda de mestre Waldemar, um dos maiores ritmistas cantadores e comandantes de roda de todos os tempos.

"Enquanto uns dizem que não há referência de Capoeira Angola em São Paulo, na verdade quando nem nascidos eram, eu já estava na roda da praça da República guerreando!"

Ananias Ferreira, teve participações de filmes nacionais como o Pagador de Promessas, Brasil do nosso Brasil, produzido por Xangô, Balbina de Iansã, Ravina entre outros.
Foi na sua chegada a São Paulo em 1953, que o mestre se fez responsável, junto a seus conterrâneos pela estruturação e da famosa roda da Praça da República. Movimento social importante que assume o papel tradicional da Capoeira, o de inclusão e resistência ao preconceito social e racial. Mestre Ananias, relatou durante o evento, que antigamente não existia Capoeira em São Paulo era apenas seu irmãozinho, o mestre Zé de Freitas.



Mestre Moraes; Durante toda infância na Ilha de Maré, em Salvador os ombros de Moraes guiaram o pai cego, vítima de um acidente de trabalho, para aonde quisesse ir, já os ensinamentos do pai continuam o ensinando. "Meu pai foi o primeiro grande mestre, o varão, o mago, o gênio da família. Ele dizia que não precisava enxergar a vida, porque a sentia". Assim como o mestre Moraes diz querer ser referência aos seus filhos. Uma referência que ensinou a Capoeira como luta, como forma de vida. A Capoeira Angola é um instrumento que tenho pra educar meus filhos, e orientá-los para a discussão da autenticidade deles. A Capoeira Angola é a representatividade do homen negro. Enquanto negro eu tenho que dar continuidade a essa luta. Eu adotei a Capoeira como minha respiração, ela está pra mim, como a água está para o peixe, e eu não permito que ninguém polua a água da qual eu preciso sobreviver. Meu radicalismo vem dai, da minha necessidade de proteger meu habitat. Qualquer pessoa que queira compartilhar desse ambiente preservando-o será bem vindo!"



"O espírito da Capoeira entra em você, não é você que entra no espírito da Capoeira"


Alienar a religiosidade ao universo da Capoeira foi um dos recursos ultilizados para que ela fosse mais facilmente aceita. Para mestre Moraes, porém, a religiosidade dentro da Capoeira é um elemento mais acentuado do que todas as suas vertentes.


"Quando vê um mais sabido, baixa o dorso em reverência"


A Palavra do mestre
Mestre Moraes, durante os três dias do evento pode conversar com todos em um diálogo franco e aberto. Diversos temas foram discutidos e seria impossível nesse curto espaço tratar todos eles. Porém poderíamos destacar três aspectos como pontos centrais das palestras por m. Moraes, vejamos:

Ancestralidade:
Tema central do encontro, mestre Moraes explicou o que entende por ancestralidade enfatizando sua importância como fundamento, como a própria raiz da capoeiragem. Entre os muitos comentários interessantes, o mestre destacou a importância da Capoeira não ficar parada no tempo, se colocando de forma efetiva como instância cultural afro brasileira na sociedade contemporânea. Porém criticou inúmeras vezes os mais diversos excessos e contra - sensos que muitas vezes acompanham essas tentativas de modernização, reconhecimento e globalização da Capoeira , ressaltou a necessidade do capoeirista de ser crítico frente as processos que descaracterizam como cultura e arte, como estilo e filosofia de vida. Nesse sentido nos lembrou como o conhecimento firme de sua própria raiz, ancestralidade, assim como vivência com os velhos mestres que representam simbologicamente a própria figura ancestral do universo da Capoeira, são pontos essenciais para que o capoeirista possa se manter lúcido e conectado com a verdadeira essência da capoeiragem e dessa forma possa agir no mundo contemporâneo sem descaracterizá-la, pelo contrário, a difundido e preservando como consciência e alto nível.
 

Ritmo, Muscicalidade e Jogo: Comentários preciosos também foram tecidos sobre os grandes fundamentos da Capoeira. em relação à musicalidade m. Moraes enfatizou clara analogia entre a bateria da roda de Capoeira com a percussão dos atabaques nas religiões de matriz africana. Tal como nelas, a música da roda de Capoeira tem a função de convocar à própria ancestralidade do jogo, criar as condições necessárias para que o espírito da Capoeira possa se manifestar naquele momento através do jogadores. Mestre Moraes comentou brevemente sobre a importante noção do transe e como é o rítmo, tal como no candomblé, o grande desencadeador dele. Fez ainda sérias ressalvas a forma como o rítmo, hoje em dia, é deixado de lado por grande parte dos capoeiristas. Por fim, durante a aula ministrada, chamou muita atenção á forma como o angoleiro deve buscar e expressar na roda. Ponto central foi a sua incisiva ênfase na elegância, na expressão do corpo, no estilo que traz a cada gesto, a negaça, mandinga e o mistério.

Educação e resistência: Em sua rica crítica ao poder estabelecido e a forma como a Capoeira continua a ser marginalizada com o poder público como legítima expressão da cultura brasileira, m. Moraes se mostrou extremamente lúcido ao falar que apenas conhecendo o poder, apenas tendo não somente o corpo como arma, mas sim, principalmente a mente , como capoeirista poderia agir nas brechas e nas fraquezas dos processos de dominação, buscando reais conquistas por suas demandas de reconhecimento. Como ele mesmo disse, o capoeirista não é capoeirista apenas na roda. Pelo contrário seu grande desafio começa fora dela no mundo vivido. Como transformar de forma positiva o universo da Capoeira, lutando pela sua preservação e reconhecimento, honrando a tradição e seus guardiões legítimos, os velhos mestres? "-Estudando"; Foi a resposta simples e direta do mestre.


Conclusão

Proporcionar eventos como este, é ter consciência, valorizando o aprendizado que não é instantâneo, e sim, demanda tempo, através do amadurecimento e crescimento individual. Respeitando o processo evolutivo e principalmente, valorizando as limitações de cada um, podemos gerar uma verdadeira compreensão do que cada um busca em sua própria vida.



"Um dos desafios mais importantes como ser humano e capoeirista" (Marcelo)

3 comentários:

  1. muito bom Marcelo, obrigado por compartilhar as palavras do Mestre, sao sempre de grande valia.
    So' uma pequena correcao, na frase abaixo da foto dos mestre se abracando, pelo menos na ladainha fala:"quando ve um mais sabido, baixa o dorso em reverencia".

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  2. Corretissima a observação de Daniel.

    Moraes.

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  3. Eeeeeita coisa bonita! Axé!

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